terça-feira, outubro 24, 2006

we're not gonna take it


O que distingue a nova geração do cinema americano é o seu humanismo. Efeitos especiais de lado, política em repouso, várias décadas de cultura pop a sustentá-los, são cineastas que percebem como ninguém a perda e a solidão. São, em última instância, os despojos destes dias do país em que vivem, nerds que se vingam artisticamente mas que nunca abandonaram a noção de diferença que os percorreu toda a vida e que é comum a toda uma geração de espectadores. Depois de Coppola, Jonze, Russell e Gondry, Jonathan Dayton e Valerie Faris juntam-se ao clube com este lindíssimo Little Miss Sunshine.

A melhor imagem que tenho, infelizmente, não está ao nível do filme. Ao vê-lo, lembrei-me imediatamente de Dee Dee Snider e os seus míticos Twisted Sisters. Essa banda, uma das piores de toda a década de oitenta, teve um grande sucesso com uma canção intitulada We’re Not Gonna Take It. É disso que fala Little Miss Sunshine, de pessoas que se cansam de levar nas orelhas e decidem assumir-se e aceitar-se como são. Filme independente sob a égide do road movie, é uma prodigiosa viagem de criação de um grupo, de união de pessoas que no início de família só tinham o nome, e acabam por preencher perfeitamente essa designação.




Como a maioria destes novos realizadores, a comédia acaba por ser o reforço dos problemas existenciais que aqui são tratados. Desconstrução da psicose americana (e, diga-se, mundial…), é um gigantesco fuck you ao mundo, a essa vontade de ganhar que se torna grotesca na sequência do concurso de beleza. Não sei dizer muito sobre este filme, mesmo que ainda falte gabar o modo escorreito como é filmado, o muito coeso grupo de actores (Steve Carrell à cabeça, a tornar-se o novo William H. Macy, rosto do falhanço do americano médio), ou a genial sequência final, ao som de Superfreak. Sei que, durante uma hora e quarenta minutos, senti orgulho em não pertencer ao ideal comum de sucesso dos tempos que correm. Deve ser a isso que chamam catarse.


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1 Comentários:

Blogger Hugo disse...

É impossível não gostar do filme. É fantástica a incursão pela mitologia americana (e consequente desmascaramento). Aquilo que tinha tudo para ser uma comédia, resulta num filme tocante e sensível.Eu não ri quando o vi. Levei um bom par de murros no estomâgo. Catarse. É isso mesmo.

11:14 da manhã, outubro 26, 2006  

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