Sobre a Reposição
Com Aurora (1927) de F.W. Murnau, o cinema Nimas aparenta ter iniciado nova vida, dedicada, a meias com o documentário, à prática de reposição de filmes do passado. Não sendo nova, essa prática parece ser de sucesso garantido, julgando, pelo menos, pela resposta popular ao filme já referido e, agora, a O Leopardo (1963) de Luchino Visconti.
À partida, as vantagens são evidentes, quer para exibidores que para espectadores. Os primeiros podem juntar os curiosos, os saudosistas, os fanáticos e os iniciados, numa abrangência francamente dificil de alcançar; os últimos podem ver um filme em horários mais variados e num espaço de tempo mais alargado que o tradicionalmente oferecido pela Cinemateca e, aproveitando iniciativas como o King Card, ver mais do que uma vez os clássicos num período de tempo mais concentrado.
Contudo, um perigo ameaça as reposições, do ponto de vista cinéfilo. a cristalização da obra de um cineasta à luz dos preceitos de uma obra magna. Por outras palavras, mostrar O Leopardo contribuirá para reavivar memórias de uns e aumentar a cultura cinematográfica de outros, mas continuará a deixar semi-esquecidas obras como Noites Brancas (Visconti, 1957). Embora Profissão: Repórter (Michelangelo Antonioni, 1975 - a ser reposto proximamente) seja um Antonioni menos conhecido, há outros mais importantes; seria interessante mostrar obras como A Aventura (1960) e O Eclipse (1962), cujo acesso é mais difícil e que, á semelhança do Visconti acima referido, são obras importantíssimas. É pena que Portugal não possa ter um circuito de reposições como o francês, onde, só em 2005, foram respostas em sala seis obras de Yasujiro Ozu e treze obras (!!) de Rainer Werner Fassbinder. Aí, os desiquilibrios serão, decerto, menores.
Etiquetas: Discussão